“Cuidar de uma cidade sempre será uma tarefa de uma sociedade”

Clécio Luís relembra altos e baixos de quem se propõe ser gestor de uma cidade apontada por ele como média, mas com problemas de cidade grande.

Na reta final de sua trajetória como prefeito da capital, Clécio Luís voltou ao rádio ontem (29) para fazer uma avaliação a respeito do fim da gestão, com um olhar para a solução dos problemas da cidade, em especial aquilo que considera avanços da gestão.

Cleber Barbosa, da Redação

Como o senhor está deixando a cidade para seu sucessor, que diga-se de passagem, a transição entre dois prefeitos era algo que não se via a bastante tempo. Melhor do que quando assumiu a Prefeitura?

Clécio Luís – Não tem nem dúvida. Peguei uma cidade em estado deplorável, terra arrasada, não precisa nem eu lembrar. Nós estávamos sem coleta de lixo, algo básico que uma prefeitura tem que oferecer. Nós estávamos com salários atrasados e com muitas dívidas. O orçamento que eu recebi era de R$ 540 milhões e a dívida era de R$ 400 milhões, ou seja, um endividamento praticamente igual a todo o orçamento para aquele ano. E não eram dívidas fundadas como as que nós vamos deixar, eram dívidas imediatas, que geravam bloqueios das contas do município, sequestros dos recursos financeiros, ações judiciais, enfim, uma situação realmente delicadíssima que dos 14 itens do CAU nós estávamos negativados em 13. Foi uma batalha gigantesca que a gente quase morre no começo, de tanta dificuldade.

E não conseguiu acessar nenhuma ajuda do Governo federal?

Clécio – Totalmente travado. Eu peguei uma única obra parada, e não em curso, a única, que foi o residencial Mestre Oscar, que não estava em andamento, o status era parada. Nós tivemos que renegociar com a Caixa Econômica e com a empresa, além de entrar com a contrapartida [financeira] para poder retomar a obra. Muito diferente da situação que eu vou deixar agora, com esse balanço de cerca de R$ 400 milhões em obras, sejam elas am andamento e sem dívidas.

E sem dívidas?

Clécio – Vou explicar o que é o sem dívidas. Vai ficar uma coisinha aqui outra ali residual, claro, como o cara que não apresentou nota, uma coisa ali mais para trás, porém uma situação residual que poderá ser paga nos primeiros cinco dias se o novo prefeito quiser. Mas claro que ele também tem o planejamento dele, poderá fazer as renegociações que achar conveniente, como eu fiz, pode alongar o perfil dessas dívidas, mas repito, vou deixar uma prefeitura saneada. Ela não é uma prefeitura superravitária, pois os recursos são insuficientes para o enfrentamento dos problemas da cidade, pois Macapá é uma cidade média, de meio milhão de habitantes, com problemas de cidade grande, porque cresceu muito rápido, e adquiriu problemas de cidade grande com receita de cidade pequena. E com hábitos de cidade pequena, daí a equalização que nós começamos a fazer, e não à toa, o slogan que há seis anos é “cidade melhor é dever de todos”, ou seja, cuidar de uma cidade não é uma terefa para um único homem ou uma única mulher, um único gestor, sempre será uma tarefa de uma sociedade.

O senhor começou se espelhando em quem? Quem era seu ídolo na política?

Clécio – Olha, o prefeito Edmilson Rodrigues tinha acabado de fazer [à época] uma excelente gestão à frente da Prefeitura de Belém, inclusive somos da mesma corrente ideológica, éramos do mesmo partido, o PSOL. A oposição tentava até dizer que era ele quem mandava aqui… [risos]. Não, na verdade ele foi uma fonte de inspiração, pois ele é fantástico, é arquiteto e urbanista e fez até o seu Doutorado em Geografia, e fez um lindo mandato em Belém, tanto é que voltou agora, então ele tinha tido uma experiência concreta, real, numa cidade como Belém, uma cidade cheia de problemas e também entrelaçada por canais como é Macapá e de população com hábitos muito parecidos com os nossos.

O crescimento desordenado de uma cidade é algo que tem como ser evitado?

Clécio – Sim, tem como. Mas é algo que exige muitos recursos, pois você pode ter o melhor planejamento, mas se não tiver recursos, nada feito, especialmente numa cidade como Macapá, que cresce de 4% a 7% ao ano. É impossível diante da quantidade de pessoas que chegaram a Macapá na década de 80 e 90, algo tão grande que a não ser que tivéssemos rios de dinheiro.

O desejo de exercer um protagonismo foi um dos motivos para o azedamento das relações com seu ex amigo Randolfe Rodrigues?
Clécio – Acho que não é ex amigo não. Estivemos em campos opostos nessa eleição. Fiz uma gestão de oito anos que o Randolfe acompanhou muito de perto, ele e o Davi. Passamos momentos muito difíceis no começo e outros tantos depois, afinal cada dia é um desafio em uma cidade como a nossa. Mas não sou propriedade de ninguém, escolhi Macapá acima de tudo e para isso fiz um sacrifício pessoal e familiar, um capítulo realmente muito lamentável, mas quando eu me tornei prefeito, e ninguém me obrigou a isso, eu assumi um compromisso do tamanho da minha cidade e na grandeza que ela merece, então fiz um movimento de ser menos partidário, menos ideológico, pois a cidade deveria estar acima de minhas ideologias, meu partido e meu grupo político.

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