Entenda as consequências do julgamento no STF para o ex-presidente Lula
Nesta semana, os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal decidiram que o ex-presidente Lula não tem direito a aguardar em liberdade até que o julgamento da suspeição do ex-juiz Sergio Moro seja finalizado. Por 3 votos a 2, os ministros entenderam que o petista deve continuar na prisão até que seja analisado o mérito do pedido de habeas corpus feito pela defesa. Os advogados de Lula pediam que as condenações proferidas por Moro fossem anuladas por entender que ele não agiu com imparcialidade ao julgar o ex-presidente.
Na sessão da terça-feira (25), o ministro Gilmar Mendes propôs que o julgamento do habeas corpus deve ser retomado depois que as mensagens reveladas pelo site The Intercept Brasil forem investigadas. As conversas sugerem que houve colaboração entre Moro, então responsável pelos processos da Lava Jato, e procuradores da força-tarefa da operação.
O que o Supremo decidiu?
Por 3 votos a 2, a Segunda Turma do STF entendeu que Lula deve continuar preso até que os ministros retomem o julgamento de um pedido de habeas corpus feito pela defesa. O adiamento foi sugerido por Gilmar Mendes, que considera que a corte deve aguardar que as mensagens entre Sergio Moro e procuradores da Lava Jato sejam investigadas.
Como votaram os ministros?
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski entenderam que Lula tem o direito de aguardar em liberdade a retomada do julgamento. Cármen Lúcia, Celso de Mello e Edson Fachin votaram pela manutenção da prisão do ex-presidente.
Quando o julgamento será retomado?
A previsão é que isso ocorra no segundo semestre deste ano.
O que pede a defesa de Lula?
Os advogados do ex-presidente querem que o ex-juiz Sergio Moro seja declarado suspeito em sua atuação nos casos do petista que tramitam ou tramitaram no Paraná. Se a solicitação for aceita, o caso do tríplex de Guarujá (SP), que originou a condenação e prisão do ex-presidente, seria anulado e voltaria para os estágios iniciais. Com isso, Lula sairia da cadeia.
O que diz a lei sobre a suspeição de um juiz?
Segundo a lei, é papel do juiz se manter imparcial diante da acusação e da defesa. Juízes que estão de alguma forma comprometidos com uma das partes devem se considerar suspeitos e, portanto, impedidos de julgar a ação. Quando isso acontece, o caso é enviado para outro magistrado.
O artigo 254 do Código de Processo Penal (CPP) afirma que “o juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes” se:
1. for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
2. ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
3. ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;
4. tiver aconselhado qualquer das partes;
5. for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
6. for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.
Segundo o artigo 564 , sentenças proferidas por juízes suspeitos podem ser anuladas.
Quais são os argumentos da defesa para que Sergio Moro seja considerado suspeito?
A defesa de Lula elenca diversos episódios ao longo da Operação Lava Jato. O principal motivador desse recurso foi o ingresso de Moro no ministério de Jair Bolsonaro, principal opositor político de Lula na campanha eleitoral de 2018.
Além disso, a defesa cita episódios como a interferência de Moro contra a concessão de habeas corpus por um juiz plantonista, em 2018, a liberação de detalhes da delação do ex-ministro Antonio Palocci que citavam o PT e interceptações telefônicas que atingiram advogados de Lula, em 2016. Neste mês, a defesa anexou no mesmo pedido as trocas de mensagens entre Moro e o procurador Deltan Dallagnol reveladas pelo site The Intercept Brasil.
O que mostram as mensagens?
O Intercept divulgou um amplo pacote de conversas entre procuradores da República em Curitiba e Sergio Moro, na época juiz federal responsável pelos processos da Lava Jato. Os diálogos aconteceram entre 2015 e 2018.
Nas conversas, Moro sugere que o procurador Deltan Dallagnol procure uma fonte que pode auxiliar a Procuradoria no processo contra Lula, opina sobre a deflagração de operações e comenta e interfere em estratégias da força-tarefa na construção das denúncias contra investigados. Também há um episódio em que o juiz pede a procuradores que produzam uma nota à imprensa em que apontem contradições no depoimento de Lula e outro em que Moro se posiciona contra investigações sobre o ex-presidente FHC por temer que elas afetassem “alguém cujo apoio é importante”.
Reportagem mais recente, feita em parceria com a Folha de S.Paulo, mostrou que procuradores se articularam para proteger Moro e evitar que tensões entre ele e o STF paralisassem as investigações em 2016. Entre as medidas estava a antecipação de uma denúncia.
O plenário do Supremo será chamado para se manifestar sobre o caso Lula?
Não. A decisão sobre o habeas corpus envolve apenas a Segunda Turma do Supremo, que é responsável por casos da Lava Jato do Paraná. O plenário do Supremo, formado pelos 11 ministros, irá, porém, julgar mais adiante um outro pedido envolvendo a defesa de Lula. Todos os juízes vão analisar se o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, corte que confirmou a condenação de Lula, pode determinar a prisão de condenados em segunda instância apenas com base em uma súmula que torna automática ordens desse tipo. Lula poderia ser beneficiado também nesse caso.
O que acontece agora com o caso tríplex?
A condenação do petista, já confirmada em duas instâncias do Judiciário, ainda precisa ser reavaliada em último grau pelo próprio Supremo. No momento, o processo está pendente de julgamento de recursos finais no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Na mais recente decisão, em abril, o STJ chancelou a condenação de Lula no caso, mas reduziu a pena para oito anos, dez meses e 20 dias de prisão.
Todo esse trâmite, porém, pode ser anulado caso os juízes do Supremo aceitem o pedido de suspeição feito pela defesa contra o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro (PSL).
Se o habeas corpus for negado no segundo semestre, quais são as outras possibilidades de Lula sair da cadeia?
A principal alternativa é a progressão de regime na condenação do caso tríplex. Lula está preso desde abril de 2018 e tem de cumprir pena de oito anos, dez meses e 20 dias de prisão. O Ministério Público Federal afirmou, no entanto, que ele já tem direito a progredir para o regime semiaberto. Quem vai decidir sobre a concessão do benefício é o STJ.
Além disso, no fim de setembro Lula atingirá a marca de cumprimento de um sexto da pena imposta. A Lei de Execução Penal prevê a progressão de regime para o preso que passar dessa marca, desde que pague a reparação de danos aos cofres públicos. O ex-presidente precisará, então, desembolsar R$ 2,4 milhões para quitar esse compromisso.
Em que estágio estão os outros processos de Lula na Justiça?
O ex-presidente já foi condenado em primeira instância em uma segunda ação penal, a do caso do sítio de Atibaia (SP). Essa condenação ainda será reavaliada pelos juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região nos próximos meses. Se confirmada, Lula poderia ser alvo de um novo despacho de prisão para que começasse a efetivamente cumprir essa segunda pena.
Além disso, há uma outra ação no Paraná, em que ele é acusado de receber propina da Odebrecht por meio da aquisição, pela empreiteira, de um terreno para o Instituto Lula. Tanto esse caso quanto o do sítio e o tríplex podem ser anulados caso o Supremo considere que Sergio Moro atuou irregularmente à frente dos processos.
Há ainda ações penais em tramitação no DF e em São Paulo, que não devem ter uma definição em breve, já que Lula ainda não foi nem ouvido.
Se Lula for solto, ele poderá disputar as próximas eleições?
Depende. Segundo a Lei da Ficha Limpa, um político condenado em segunda instância só pode concorrer oito anos depois que sua pena for extinta. Lula cumpriu pouco mais de um ano dos oito anos e dez meses a que foi sentenciado. No atual cenário, ele só poderá se candidatar em 2035, quando terá 89 anos.
A única possibilidade de o petista concorrer em 2020 é se a condenação do caso do tríplex for anulada e ele não sofrer nenhuma outra condenação em segunda instância até a eleição.