TJAP resgata documentos históricos do Cartório do Bailique para restauração e digitalização
O trabalho de digitalização, preservação, restauração e disponibilização dos materiais será encaminhado pela equipe multidisciplinar das comissões de Memória e Preservação Digital.
Da Redação
A história do estado do Amapá e a do Poder Judiciário do Amapá se confundem e se permeiam profundamente. Prova disso é que quase todos os nascimentos, casamentos e óbitos passam por registros em serventias que exercem atribuições delegadas pelo Poder Judiciário: os cartórios. Importantes momentos dessa história foram resgatados quando, durante Correição Extrajudicial no Cartório de Registros Públicos e Tabelionato de Notas do Bailique – “Cartório Manoel Queiroz”, ao final de julho de 2022, a equipe da Corregedoria Geral das Serventias Extrajudiciais detectou o avanço do fenômeno das terras caídas (uma espécie de assoreamento), que chegou a poucos metros do Cartório do Bailique e ameaçou não apenas a conservação, mas também a própria custódia do acervo.
Sob orientação do Corregedor-Geral de Justiça Agostino Silvério Junior e da juíza corregedora Liége Gomes, o servidor Alessandro Tavares, da Coordenadoria de Gestão Extrajudicial (Cogex), encaminhou a maior parte do acervo ao Posto Avançado do TJAP no Bailique (situado na Passarela Milonês Amanajás) e trouxe, no início de agosto, os livros mais antigos e mais deteriorados pelo tempo à sede do Tribunal para providências mais especializadas: armazenamento mais adequado para evitar aumento da deterioração, tratamentos corretivos e preventivos (contra mofo e insetos), restauração (quando possível), digitalização e acessibilidade do conteúdo. O acervo mais antigo soma nove livros de nascimento (de A – 01 a A – 09), seis livros de casamento (B – 02, 03, 04, 06, 07 e 08) e dois livros de óbitos (C – 01 e C – 02).
A equipe da Corregedoria-Geral da Justiça observou que uma parte do acervo registral é herança do período da Primeira República, iniciada com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, a exemplo do Termo 001, do Livro A-01 (Registro de Nascimento), datado de 20 de março de 1891. Entre os atos registrais constam as primeiras famílias que chegaram ao Arquipélago do Bailique, algumas oriundas de localidades como Vigia e Abaeté (ambas no Pará), dentre outras.
“Fazer parte da equipe que conduziu as tratativas para que este acervo histórico seja digitalizado é, sem dúvida, um momento muito especial, principalmente por saber que muitos desses documentos dizem respeito a alguns antepassados”, relatou o coordenador da Cogex.
“Foi uma grande surpresa descobrir que meu tataravô, Tenente Coronel Antônio Vicente Cordeiro Sobrinho, assinou como testemunha o Termo 001, do Livro de Nascimento e que celebrou vários casamentos, enquanto desempenhou a função de segundo suplente de Juiz Substituto no Bailique”, complementou. “Esses livros precisam ser preservados, são um patrimônio não apenas para o Cartório, mas também para a sociedade amapaense, pois registram a história de pessoas”, concluiu o servidor.
De acordo com a juíza Liége Gomes, Corregedora Permanente das Serventias Extrajudiciais da Comarca de Macapá, “os livros que fazem parte do acervo do cartorário são manuscritos e impressos de grande importância histórica, porque podem retratar as origens de uma sociedade e a ancestralidade das pessoas. Portanto, é necessário que busquemos a sua restauração, para garantia da preservação dessas informações, como exemplo o registro civil de uma pessoa que tem grande importância desde o nascimento, ultrapassando inclusive os limites da morte, diante das consequências jurídicas advindas de todos os atos, ações e omissões do seu titular, além de preservar a segurança social”, defendeu.
“Ao que verificamos os livros datam do ano e estão em péssimo estado de conservação, tanto pelo envelhecimento da celulose como pelo ataque dos anobídeos, espécie de cupim que se alimenta da celulose. Daí nossa preocupação em removê-los temporariamente da serventia do Distrito do Bailique para a capital a fim de avaliarmos a melhor forma de prevenção desse acervo”, complementou a juíza corregedora.
Em reunião com membros da Comissão Permanente de Preservação Digital e da Comissão de Gestão da Memória do Poder Judiciário do Amapá, a juíza Liége Gomes e o servidor Alessandro Tavares comprometeram-se a fazer os encaminhamentos administrativos para que o material seja entregue oficialmente ao Arquivo Geral da Comarca de Macapá para que seja dado o devido tratamento e acondicionamento do acervo.
O trabalho de digitalização, preservação, restauração e disponibilização dos materiais será encaminhado pela equipe multidisciplinar das comissões de Memória e Preservação Digital. De acordo com o arquivista Apoena Aguiar, “temos algumas medidas a tomar: a emergencial que é iniciar a preservação destes materiais, para evitar que se danifiquem mais e minimizar ou, se possível, reparar os danos já ocorridos; analisar a documentação com um olhar mais técnico sobre as condições em que se encontram e sobre o conteúdo, com sua organização intelectual; e definir um plano de ação, se vamos digitalizar tudo, etc.”
“Mas precisamos também lançar um olhar jurídico quanto às responsabilizações, pois o Amapá não tem um arquivo público, que seria um destino possível, e a Lei diz que a documentação deve permanecer sob a guarda do titular, mas pode ser elaborado um termo de doação destes materiais ao memorial do Tribunal de Justiça do Amapá, por exemplo”, complementou.
O historiador Marcelo Jaques registrou a importância dos documentos por figurarem entre os primeiros registros feitos pelo estado, pois antes era uma atividade da Igreja Católica. “Idealmente, os documentos deveriam retornar ao local em que os registros foram produzidos até para uma eventual procura por pesquisadores ou pessoas diretamente interessadas, por questões de ancestralidade, por exemplo, mas tendo em vista a situação especial que o Bailique vive, a preservação do acervo deve ser prioridade e creio que o melhor encaminhamento é o que está sendo dado”, ponderou.
Quando organizado e digitalizado, o conteúdo receberá os devidos tratamentos para divulgação, disponibilização e acessibilidade online, com possibilidade de integração do Acervo do Memorial do TJAP e do futuro Museu Virtual da Justiça do Amapá.
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